Suinocultura

Brasil deve se beneficiar de veto da China à carne suína do Canadá

1 de julho de 2019
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O Brasil e a União Europeia devem ser os principais beneficiados pela decisão da China de bloquear a importação de carne suína do Canadá após constatação do uso de um aditivo alimentar proibido e de fraudes em documentos de exportação. O bloco europeu é líder do comércio mundial de carne suína, com 3,25 milhões de toneladas exportadas por ano, seguidos pelo Canadá, com 1,39 milhão de toneladas, e pelo Brasil, com 735 mil toneladas.

Rastros de ractopamina foram encontrados pelas autoridades chinesas em embarques de carne congelada do frigorífico Frigo Royal, de Quebec, em 18 de junho. Banida na maioria dos países, a substância é utilizada para fazer os animais ganharem músculos mais rapidamente, sem precisar aumentar a quantidade de grãos ingeridos. O Brasil, que já sofreu embargo de quase um ano da Rússia pelo uso da ractopamina na carne suína, segue atualmente um rígido controle de segregação dos lotes produzidos com a substância.

Ao realizarem a investigação sanitária nos contêineres canadenses, os fiscais chineses acabaram encontrando 188 documentos de exportação falsos. Em nota oficial, a Embaixada da China no Canadá informou que a fraude passou incólume pelo sistema oficial de certificação canadense, o que reflete “brechas óbvias de segurança”. A ministra canadense da Agricultura, Marie-Claude Bibeau, confirmou por e-mail que “certificados de exportação não-autênticos” foram utilizados.

A suspensão põe um freio ao rápido crescimento das exportações de carne suína do Canadá para a China neste ano, beneficiadas pela escassez da proteína animal em função da epidemia de febre suína africana no país asiático, o maior consumidor mundial. Em 2018, o Canadá exportou para a China 283 mil toneladas de carne suína. O Brasil, no mesmo período, exportou 154,5 mil toneladas.

Para o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal, Francisco Turra, o imbróglio chinês com o Canadá “desloca um pouco o mercado e dá oportunidade para outros competidores”. O episódio, observa ele, acontece num momento em que a China elevou as compras de todas as carnes devido às perdas causadas pela peste africana. Analistas do Rabobank previram, em abril, que de 150 milhões a 200 milhões de cabeças de suínos do plantel chinês morrerão por causa da epidemia ou terão de ser sacrificadas.

Crise de 2018 impede maiores ganhos de mercado
“Estamos esperando hora a hora. Os chineses fazem isso estrategicamente, procuram não se açodar, porque se mostrarem que estão desesperados, pode ocorrer uma brusca elevação de preços. E eles têm produto em estoque, porque muita gente com rebanho sadio está tentando se livrar dele, para aproveitar a demanda e também para escapar da epidemia de peste suína”, diz Turra. “Esticando a corda, a gente deve aumentar em 20% as exportações para a China neste ano. Nossa possibilidade é pequena, porque o setor viveu no ano passado muita crise e não se expandiu. Agora surgiu uma oportunidade que veio para ficar por longo tempo. Debelar a crise da febre suína é um processo complicado”.

O analista de carnes da agência Safras & Mercado Luis Fernando Iglesias prevê uma “janela bem interessante para exportar carne suína para a China, e outras carnes também, por pelo menos dois a três anos”. O que impede um salto imediato nas exportações, segundo ele, é o fato de os frigoríficos habilitados pelos chineses estarem operando próximo da capacidade máxima. “A ministra da Agricultura Tereza Cristina esteve na China entre 22 e 26 de maio e pediu resposta em um mês sobre o pedido de habilitação de novos frigoríficos. Pode ser que tenhamos novidade nos próximos dias”, aponta.

Os efeitos do disparo da demanda na China já podem ser sentidos no mercado doméstico brasileiro. Em Santa Catarina, principal exportador brasileiro, o preço do quilo do pernil de porco no atacado saiu de R$ 7,20 no início do ano para R$ 7,80 atualmente, com projeção de chegar até R$ 8,10 no final do ano. O pernil suíno é um dos cortes mais importados pelos chineses. “Neste ano, a China se tornou o principal importador das três proteínas animais do Brasil. Aves, suínos e bovinos. No frango, superou a Arábia Saudita e o Japão. Além de todo o prejuízo econômico por causa da febre suína africana, o fato é que eles têm muitas bocas para alimentar”, diz Iglesias. Com o mercado brasileiro próximo de uma recessão, Iglesias diz “não ter dúvidas” que o foco dos frigoríficos está totalmente voltado para as exportações.

Caso ‘Huawei’ interfere nas relações
O veto da China à carne suína canadense ocorre em meio ao aumento das tensões entre os dois países. No final do ano passado, o Canadá prendeu a diretora-financeira da Huawei Technologies, Meng Wanzhou, filha do fundador da empresa, a pedido de autoridades americanas. Desde então, em suposta retaliação, Pequim já prendeu dois canadenses e revogou licenças de importação de canola de duas empresas do país norte-americano, alegando de ter encontrado embarques contaminados com pragas e doenças.

Segundo a ministra Marie-Claude Bibeau, a Agência de Inspeção Alimentar do Canadá “tomou todas as medidas necessárias para enfrentar a questão e está trabalhando em estreita cooperação com parceiros da indústria e oficiais chineses”.

Reportagem do jornal canadense Globe and Mail prevê que a retomada das exportações de carne suína para o país asiático pode demorar mais do que preveem as autoridades locais. “É razoável pensar que a retomada dos embarques vai depender muito da normalização das relações diplomáticas entre a China e o Canadá, ou, pelo menos, no relaxamento das tensões”, disse Lin Rongquan, médico veterinário e consultor em Pequim.

Para o diário chinês National Business Daily, o veto à carne canadense deve ter impacto mínimo no mercado doméstico, visto que os embarques do Brasil têm crescido substancialmente. Turra, da ABPA, diz que, de fato, os chineses estão vindo para cá com mais apetite. “Os Estados Unidos, com as tarifas elevadas, nos deixam ainda mais competitivos. Sobram a União Europeia e o Brasil como únicas opções de fornecedores”. “Temos uma responsabilidade ainda maior de estar na vanguarda da prevenção da febre suína africana. Não podemos errar”.”

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